quarta-feira, 8 de julho de 2015

A menina que deixou de tomar banho para não pensar















      Marília era um daqueles modelos complicados: desde que saiu de fábrica os pais diziam que daria problemas. Cresceu cercada por todas as expectativas negativas que ouviu do seu comportamento. E, num vale de introspecção, ela se banhou.
Ela formou-se em direito, Magna Cum Laude, orgulho da família. “Quem diria que chegaria tão longe, quando parecia ser tão desajuizada”, diziam os parentes mais longínquos, no entanto, até então ela não havia parado para pensar que poderia ser antes de um problema para os outros, um problema para si mesma.
Ao voltar do trabalho, encontrou a palavra “problema” num desses cartazes publicitários que passam por a gente na vida. Chegou em casa, colocou a chave na mesa da sala como de costume e após livrar-se de tudo o que a cobria, foi ao chuveiro. Ela fechou os olhos e sua mente começou a pensar nos problemas. Logo, abriu as pálpebras e assustou-se com aquilo. Fechou os olhos novamente e com os novos problemas, uma pequena angústia cresceu no seu estômago junto com o sanduíche que havia comido no almoço. Sem saber porque pensava aquilo, agora queria respostas que o estudo e a experiência não lhe davam.
Desligou o chuveiro e, sem se secar, correu para a cama. Se cobriu e ficou de olhos abertos vendo o branco de seu lençol e aquilo a acalmou. Começou a achar que a água saída do chuveiro havia tirado as camadas que haviam por cima de todas aquelas indagações. Decidiu que não voltaria a se preocupar com isso e não pararia para pensar nos problemas de novo.
Começou a evitar o banho, os sinais de trânsito, as pausas para o café, as filas, as ligações de parentes e com um mês, já havia desistido de sair de casa. Muitos anos se passaram e no último bater das asas da vida, percebeu que não havia vivido por ter medo dos problemas.

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